sábado, 23 de abril de 2011

Controle de Qualidade em Processamento de Soja

REVISÃO DA LITERATURA

A qualidade da proteína da soja é limitada por vários fatores, dentre eles a deficiência em aminoácidos sulfurados e a presença de substâncias antinutricionais, que podem modificar o metabolismo normal de animais monogástricos.
Entre as substâncias que produzem estes efeitos prejudiciais, destacam-se os inibidores de proteases (antitríptico), as hemaglutininas (lectinas), os compostos fenólicos (taninos), as antivitaminas, as saponinas e os quelantes de metais.
Os antitrípticos são proteínas, que quando presentes no trato intestinal prejudicam a digestão protéica levando a um aumento na produção de enzimas pelo pâncreas, com conseqüente hipertrofia deste órgão. Os prejuízos ao desenvolvimento do animal serão inevitáveis (LIENER & KAKADE, 1980).
As hemaglutininas também são proteínas que possuem em suas moléculas um centro ativo específico à combinação com carboidratos, e portanto, capazes de aglutinarem seletivamente eritrócitos, e interagirem com as células da mucosa intestinal, prejudicando o processo de absorção e contribuindo para a toxidez dos grãos de leguminosas (LIENER & KAKADE, 1980).
Os taninos têm habilidade para se complexarem com proteínas, o que interfere na utilização nutricional das mesmas, levam a lesões no trato intestinal, e podem bloquear o sistema digestivo (LIENER, 1981).
Antivitaminas são compostos que diminuem ou eliminam o efeito de vitaminas, de modo específico (SOMOGYI, 1973).
As saponinas são substâncias que causam ruptura dos eritrócitos “in vitro” (LIENER & KAKADE, 1980), e quando incorporadas ás rações de aves, causam retardamento no crescimento destas.
Os quelantes de metais ou fitados, existentes nos grãos de cereais, complexam-se com metais, alguns indispensáveis à alimentação, diminuindo a disponibilidade destes e aumentando seus requerimentos pelos animais (DURIGAN, 1994).

 Inativação térmica dos fatores antinutricionais

A ação dos antinutricionais protéicos presentes nas leguminosas pode ser evitada, e o valor nutritivo dos grãos incrementado, com a correta aplicação de calor.
O aumento no valor nutricional é dependente da temperatura, da duração do aquecimento, do tamanho das partículas e do conteúdo de umidade (BUSHMAN,1979).
O controle deste tratamento apresenta alguns complicadores como, as atividades hemaglutinante e antitríptica apresentam grande diferença quanto a estabilidade ao calor. As espécies de leguminosas, dados as suas diferenças estruturais e químicas, apresentam diferentes respostas a este tratamento térmico. Em alguns materiais, estas atividades são destruidas em menos de 10 minutos a 100ºC, enquanto em outros elas ainda podem ser detectadas após 60 minutos a 100ºC.
Dada esta necessidade de tratamento térmico, tem-se proposto para a soja integral vários tratamentos que possibilitem sua utilização na alimentação de animais monogástricos, ou sejam: extrusão, tostagem, micronização, microondas e cozimento em vapor ou água fervente.
O processo de extrusão, que envolve calor úmido e pressão, provoca o rompimento da parede celular com conseqüente desnaturação protéica, propiciando maior exposição dos nutrientes (BUSHMAN, 1979).
Na tostagem, o aquecimento é realizado sob condições de baixa umidade e a temperatura e tempo de aquecimento variam de acordo com o tipo de equipamento (WALDROUP et al., 1985).
A micronização consiste no tratamento dos grãos por calor seco emitido por raios infravermelhos (NETO, 1992).
O aquecimento com microondas se dá pela interação de ondas eletromagnéticas com moléculas polarizadas, criando fricções infra e intermoleculares, que resultam na produção de calor (MAcLEOD, 1972).
O cozimento em vapor, geralmente é realizado em autoclave, que emprega altas temperaturas e pressão, enquanto que em água fervente é feito á atmosfera ambiente e com grãos imersos em água.
A maceração, ou seja, a hidratação dos grãos antes do aquecimento, tem sido recomendada por muitos pesquisadores (LIENER, 1962; NORDSTROM & SISTRUNK, 1977; DURIGAN et al., 1978; KANEOYA, 1993). Sua principal finalidade, de acordo com CABRAL (1981), é de uniformizar o cozimento e tomá-lo mais rápido.
RACKJS (1966) mostrou que o tratamento com vapor (100ºC), por 20 minutos,
foi muito eficiente na eliminação da atividade antitríptica da soja, quando esta
continua 25% de umidade e que esta eficiência era bastante diminuída quando a
umidade era reduzida para 6%.
GALLARDO et al. (1974), BUERA et al. (1984) e SHARMA & SEHGAL (1992) também concluíram que a inativação do inibidor de tripsina quando a soja macerada em água (25ºC por 10 horas) foi aquecida em água fervente por 20 minutos.
O aquecimento tem se mostrado bastante eficiente para grãos, mas com efeito reduzido ou mesmo ineficiente quando se trata de farinha ou do inibidores purificados, que se apresentam bastante estáveis a este tratamento.
Vários autores têm reportado a presença de inibidores ativos , após o aquecimento da farinha em água fervente, por 30 minutos (ANTUNES & SCARBIERI, 1980; BOROWSKA & KOZLOWSKA, 1931; DHURANDHAR & CHANG, 1990).
RAYAS - DUARTE et al. (1992), estudando nove cultivares de feijão (Phaseolus vulgaris), mostraram que a atividade dos inibidores de tripsina apresentam estabilidade mínima nos grãos, média na farinha e máxima no extrato aquoso (albumina), quando aquecidos em água fervente por 30 minutos.
O aquecimento de grãos de feijão a 190ºC, por 30 segundos, resultou na inativação de cerca de 72% da atividade dos inibidores (CARVALHO et al., 1977), porém a farinha, ao ser aquecida em estufa a 100ºC, por 30 minutos, não resultou em perda da atividade dos inibidores de tripsina, indicando a alta estabilidade para o tratamento a seco (RAYAS - DUARTE et al., 1992).
Os efeitos dos tratamentos térmicos sobre os fatores antinutricionais do feijão-alado (Psophocarpus tetragonolobus L. DC) foram estudados por KADAM et al. (1987). Observaram que os tratamentos dos grãos com raios infravermelhos, e o cozimento em água fervente, assim como a autoclavagem da farinha, foram os mais eficientes para inativar as atividades dos inibidores de tripsina e hemaglutinante, e reduzir o nível de taninos. No entanto, o aquecimento da farinha em microondas e estufa, não tiveram efeitos sobre estes constituintes.
BRENES et al. (1973) autoclavaram grãos de feijão (Phaseolus vulgaris) a 121ºC, por período variando de O a 180 minutos, e sugeriram que a relação ótima entre o tempo e a temperatura de aquecimento deve ser conhecida para cada espécie ou cultivar, uma vez que o tratamento térmico insuficiente não produz resultados satisfatórios, e o excesso prejudica o valor nutritivo dos grãos.
As alterações sofridas pelos grãos durante o cozimento são de modo geral favoráveis ao aproveitamento dos mesmos, mas o aquecimento excessivo pode ocasionar a destruição parcial ou total dos nutrientes termolábeis, o que é agravado quando não se tem conhecimento satisfatório dos diferentes efeitos do binômio tempo e temperatura.
Para avaliar a intensidade do tratamento térmico, objetivando a inativação dos fatores antinutricionais e melhora na qualidade nutricional das proteínas, têm sido propostas as determinações da solubilidade da proteína e da atividade ureática. Vários pesquisadores têm demonstrado decréscimo na solubilidade da proteína da soja com aumento no aquecimento (SMITH & CIRCLE, 1972; ANTUNES & SGARBIERI, 1981; LEE & GARLICH, 1992). Experimento realizado por ARABA & DALE (1990 a), com autoclavagem da farinha de soja por 0, 5, 10, 20, 40 e 80 minutos, mostrou que a solubilidade da proteína, em hidróxido de potássio, diminui de 86,6% para 40,8% em 80 minutos abaixo de 70% indicam super aquecimento.
A soja contém uma enzima denominada urease, que apesar de não causar efeitos antinutricionais aos animais é usada como indicador nas indústrias de extração de óleo, bem como de processamento de soja integral, no controle da aplicação do calor.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Ração (ANFAR, 1992), recomenda que o farelo de soja para ser comercializado, deve ter atividade ureática entre 0,05 e 0,30 unidades de pH.

Efeito do tratamento térmico na composição de aminoácidos

O tratamento térmico parece ser o processo que mais afeta a qualidade nutricional da proteína da soja. MAGA et al. (1973) consideraram que o aquecimento toma as proteínas mais susceptíveis à hidrólise enzimática devido as seguintes possibilidades: modificações estruturais da proteína; destruição dos fatores anti­enzimáticos presentes no produto; atuação nos lipídeos e carboidratos que estavam ligados à proteína.
Com o aquecimento, em geral, a qualidade protéica aumenta no período inicial do tratamento, devido à inativação dos fatores biologicamente ativos. Após alcançar os valores máximos diminui, devido à destruição e/ou perda de disponibilidade de aminoácidos essenciais, como cistina e a lisina (DEL VALE, 1981).
Uma importante propriedade das proteínas da soja é o seu alto teor em aminoácidos essenciais, particularmente lisina, triptofano, fenilalanina e leucina (BOOKWALTER et al., 1971). Entretanto, são deficientes em sulfurados (metionina e cistina) conforme o evidenciado por WOLF (1970); KAKADE et al. (1972), LAM­SÁNCHEZ (1978).
A composição em aminoácidos está relacionada além da variabilidade genética, das condições climáticas e de plantio, ainda aos tipos de processamento.
O efeito de vários tratamentos térmicos na composição em aminoácidos do feijão-alado foi avaliado por KADAM et al. (1987). Observaram menor conteúdo de lisina e valina na farinha tratada em autoclave e nos grãos aquecidos em água fervente ou com infravermelho, em relação à farinha não tratada. Perdas significativas de treonina e arginina também foram aquecidos em água fervente, porém a composição em aminoácidos essenciais não foi influenciada pelo aquecimento em estufa e microondas
Estudando o efeito do aquecimento no valor nutricional de diversas dietas preparadas com proteínas de sementes de oleaginosas (algodão, amendoim ou soja), RHEE & RHEE (1981) verificaram que após 2 horas de aquecimento a 100ºC houve perda de lisina disponível e de aminoácidos totais, principalmente arginina, lisina, triptofano e histidina.


 Controle de qualidade do processamento da soja integral

As principais observações sobre o baixo valor nutricional das proteínas da soja crua para ratos, e o aumento de suas qualidades nutricionais pelo tratamento com calor foram obtidas, no inicio do século, por OSBORNE & MENDEL (1917). Estas foram posteriormente estendidas a outras espécies animais.
CHERNICK et al. (1984) verificaram que aves alimentadas com dieta contendo farinha de soja crua apresentaram crescimento retardado e hipertrofia do pâncreas.
Ao analisarem o nível de inclusão da soja crua em dietas para aves, WALDROUP & COTTON (1974) recomendaram que a ração não deveria conter mais do que 25% de soja crua. A substituição parcial do farelo de soja por grãos de soja crus, aos níveis de 4 a 8% em rações de crescimento para frangos de corte, foi analisada por SOUZA (1978), onde conclui que esses níveis não afetam o consumo de ração e a conversão alimentar, mas interferem de maneira depressiva no ganho de peso dos animais.
WOOD et al. (1971) compararam o efeito da substituição de soja crua em dietas para aves com diferentes idades. Observaram que a soja crua não deveria ser incluída nas dietas, antes das aves completarem 4 semanas de idade, tendo em vista o pior desempenho observado nesta fase, atribuído à deficiente utilização do nitrogênio e à queda no apetite, causados pela ingestão da soja crua.
Apesar da susceptibilidade das aves aos fatores antinutricionais da soja diminuir com a idade, os resultados dos experimentos realizados por ALUMOT & NITSAN, 1961; BORNSTEIN et al. 1961, indicam que a soja ou o farelo de soja devem ser tratados termicamente para serem utilizados em rações para aves.
Os trabalhos realizados por HULL et al. (1968) e MITCHEL et al. (1972) indicaram que temperaturas de 115ºC a 125ºC na tostagem da soja produziram resultados satisfatórios para frangos, desde que a ração fosse peletizada. No entanto, BRAY et al. (1971) indicaram que temperaturas mais elevadas seriam necessárias para se evitar a hipertrofia pancreática.
Apesar da qualidade nutricional da soja e de seus derivados ser aumentada com o aquecimento, um subprocessamento pode ainda implicar em baixa qualidade do farelo, dados os níveis elevados de fatores antinutricionais ativos. Por outro lado, um superprocessamento reduz o valor nutritivo, principalmente por tomar a lisina indisponível (ARABA & DALE, 1990).
WHITE et al. (1967) observaram que a soja processada em autoclave, por 30 minutos a 0,42 Kg/cm com uma adição de 30% de água, era adequada para frangos.
Com objetivo de determinar o menor tempo requerido para o processamento da soja integral, SIMOVIC et al. (1972) conduziram um experimento onde a temperatura variou de 2O4ºC a 316º C e o tempo de aquecimento de 1 a 3 minutos. Para cada tempo foi encontrada uma temperatura ótima, avaliada pelo ganho em peso e a conversão alimentar em pintos. Estes parâmetros foram melhores para todos os grupos que receberam soja tratada.
A literatura apresenta resultados bastante conflitantes com relação aos efeitos do aquecimento dos alimentos em tomo de microondas. KALAFAT & KROGER (1973) constataram que vários estudos demonstraram poucas diferenças nutricionais significativas entre alimentos aquecidos por microondas e aqueles aquecidos por métodos convencionais. Por outro lado LORENZ (1976) ao revisar a literatura sobre o efeito do microondas na composição dos alimentos concluiu que estes perdem mais umidade e retém mais as propriedades originais da proteína, como por exemplo a solubilidade.
WHING & ALEXANDER (1975) verificaram que para se obter boa qualidade nutricional das proteínas, o período ótimo de aquecimento do grão de soja, com 48% de umidade, por microondas, está entre 2 a 3 minutos.
Utilizando a soja integral processada em forno de microondas em rações para poedeiras. PABLOS (1987) observou baixa digestibilidade da proteína.
A quantidade de grãos de soja, com 10% de umidade, a ser processada, e o tempo de aquecimento em microondas na qualidade nutricional para frangos de corte, foram investigados por FULLER JR et al. (1988). Para isso, aqueceram quantidades de 11 a 13 Kg de soja por tempo de 234, 294 e 354 s/Kg e observaram diminuição significativa no ganho em peso das aves com o aumento do tempo de aquecimento, enquanto que a atividade dos inibidores de tripsina foi reduzida satisfatoriamente. Em outro experimento, processaram quantidades de 2Kg de soja por tempos de 470, 510, 550 s/Kg, e observaram redução na atividade dos inibidores, a disponibilidade de lisina permaneceu alta e não observaram diferenças significativas no ganho em peso.
A avaliação de vários tratamentos térmicos na qualidade da proteína do feijão alado para ratos, foi estudada por KADAM et al. (1987). Os autores verificaram que ratos alimentados com dietas contendo feijão cru, feijão tratado em microondas e em estufa, apresentaram menor ingestão de matéria seca e perda significativa de peso. Aumento no consumo de matéria seca e no ganho em peso foi observado ao se incorporar às dietas o feijão tratado em água fervente, raios infravermelhos e autoclave.
A relação entre o conteúdo de inibidor de tripsina presente na ervilha e a digestibilidade da proteína foi avaliada por CARRE & CONAN (1989). Em experimentos com aves em crescimento, substituiram 40% do farelo de soja por farinha de ervilha proveniente de grãos autoclavados. Os dados obtidos mostram que não houve correlação significativa entre o aumento da digestibilidade aparente da proteína e a diminuição no conteúdo de inibidores de tripsina, levando à conclusão de que a atividade do inibidor não é o único fator envolvido com esta digestibilidade.
ARABA & DALE (l990b) autoclavaram (121ºC) farelo de soja por 0, 15, 30 e 60 minutos (experimento 1) e por 0,5; 10, 15 e 20 minutos (experimento 2) e observaram que as atividades da urease e dos inibidores de tripsina, assim como a solubilidade da proteína, diminuíram com o aumento do tratamento térmico. O melhor crescimento das aves foi obtido quando o farelo foi autoclavado por 15 minutos, o que resultou em solubilidade da proteína de 75%, atividade ureática de 0,12 unidades de pH e porcentagem de atividade residual dos inibidores de tripsina de 10%. O aquecimento por 60minutos levou a uma diminuição no ganho em peso e prejudicou a conversão alimentar. Observaram também que o peso relativo do pâncreas foi significativamente reduzido com a autoclavagem.
A eficiência das análises “in vitro”, como parâmetro para avaliar a intensidade do tratamento térmico, e a qualidade nutricional das proteínas tem sido questionada. McNAUGHTON & REECE (1980) demonstraram que a atividade ureática igual a zero, em farinha, nem sempre é indicativo de perdas pelo aquecimento, pois baixos níveis desta atividade não se correlacionam com prejuízo no desempenho das aves. Esta análise não permite expressar valores para a severidade do superprocessamento (ARABA & DALE, 1990; ANDERSON - HAFERMNN et al., 1992). NOLAND et al. (1976) sugeriram que a atividade ureática não deve ser usada como único indicador do valor nutricional da soja integral para suínos.
ARABA & DALE (1990) sugerem que a solubilidade da proteína pode ser utilizada para detectar o superprocessamento da soja integral. No entanto, ANDERSON - HAFERMANN et al. (1992) não a recomendam, pois não observaram mudanças consideráveis na solubilidade da proteína com o aumento no tempo de autoclavagem, no intervalo de O a 15 minutos. Ainda MARSMAN et aI. (1993) concluíram que a atividade ureática não se mostrou adequada para a avaliação de produtos extrusados, enquanto que o índice de solubilidade do nitrogênio em hidróxido de potássio for maior, até mesmo quando as condições de extrusão foram extremas.
A atividade dos inibidores de tripsina como parâmetro indicador do processamento térmico e do valor nutricional da soja integral para aves também tem sido investigada. HERKELMAN et al. (1991) verificaram que frangos de corte alimentados durante 21 dias, com farinha de soja integral apresentaram máxima performance quando os grãos foram aquecidos a 12lºC por 40 minutos. Observaram que a adição de metabissulfito de sódio reduziu pela metade o tempo de aquecimento requerido para inativação dos inibidores, e concluíram que a atividade do inibidor de tripsina se mostrou mais exata do que a atividade ureática na avaliação dos efeitos dos tratamentos aplicados.
VELTMAN et al. (1986) sugeriram que a qualidade nutricional do farelo de soja processado comercialmente, deve ser avaliada não somente com base nos testes “in vitro”, mas também com base em testes biológicos.
Os melhoristas da soja também têm se preocupado com o aspecto nutricional da mesma além do agronômico, o que levou ao desenvolvimento nos EUA, da linhagem KFSB, ou seja, com baixa concentração do inibidor de Kunitz, com manutenção das outras características desejáveis.
Esta soja integral crua, tem se mostrado superior à soja convencional, em dietas para aves (PEO et al., 1938; HERKELMAN et al., 1989), porém com qualidade inferior ao farelo de soja comercial (HAN et al., 1991; ZHANG et al., 1991). Isto sugere que aumentos no valor nutricional devem estar associados à melhora na digestibilidade das proteínas e a aumentos na disponibilidade de aminoácidos (KOELHER et al., 1938).
Embora a soja KFSB tenha uma redução de 40 a 50% na atividade dos inibidores de tripsina, em relação a soja convencional, seu máximo valor nutritivo, para aves, também é alcançado com o tratamento térmico, cuja intensidade requerida para se obter um ótimo grau de qualidade da proteina é menor do que os aplicados a soja convencional. (ANDERSON - HAFELMANN et aI., 1992; HERKELMAN et al., 1992; 1993). O efeito benéfico também está associado com a desnaturação da proteína (KAKADE et al., 1973) e a redução na atividade hemaglutinante (FRIEDMAN et al., 1991).
Os níveis de atividades dos inibidores de tripsina na soja integral e no farelo que podem causar efeitos deletérios às aves não são totalmente conhecidos. ANDERSON - HAFERMANN et al. (1992) observaram que a soja crua com atividade do inibidor igual a 6.780 unidades/g amostra produziram ganho em peso igual a 97 g, enquanto que soja KFSB com atividade igual a 4.276 unidades/g amostra propiciaram ganho em peso de 117 g. Os melhores resultados foram obtidos quando a atividade do inibidor foi reduzida para 1.169 unidades/g, com 15 minutos de autoclavagem, e 844 unidades/g com 12 minutos para sojas, convencional e a KFSB, respectivamente. Observaram também que embora estes materiais contivessem maior atividade inibidora do que o farejo de soja comercial (268 unidades/g), as aves apresentaram performance similar, levando-os a concluir que estes níveis de inibidor foram aparentemente insuficientes para causar depressão ao crescimento.
O      valor nutricional da proteína da soja também é afetado pela presença de hemaglutininas ou lectinas, que são proteínas capazes de se ligarem especificamente a carboidratos, em solução, ou unirem às membranas das células, aglutinando-as.
Os efeitos nos animais monogástricos atribuídos às lectinas são: retardamento no crescimento (LIENER, 1953), diminuição da digestibilidade e absorção de nitrogênio (JAFFÉ & CAMEJO, 1961), diminuição da digestibilidade de carboidratos (REA et al., 1985), alteração da atividade das enzimas intestinais e hepáticas (JINDAL et al., 1984) e diminuição da insulina do sangue (PUSZTAI et al., 1986).
O      mecanismo do efeito antinutricional das hemaglutininas foi proposto por JAFÉ (1968). Quando administradas oralmente, o efeito tóxico pode ser causado pela sua habilidade em ligar-se a receptores específicos das células epiteliais da parede intestinal. PUSZTAI et al. (1979) mostraram que as hemaglutininas reagem com as células intestinais in vitro” e causam o rompimento de microvilosidades das células epiteliais (mucosa) do duodeno e do jejuno. Embora prejudicada em certa extensão, a absorção ainda pode ocorrer, provavelmente através das células não rompidas do intestino delgado. Em adição, absorção anormal de substâncias potencialmente perigosas pode ocorrer, como as próprias hemaglutininas ou toxinas de origem bacteriana, como resultado do rompimento causado pelas hemaglutininas aos epitélios.
TURNER & LIENER (1975) avaliaram o significado nutricional da hemaglutinina da soja, na alimentação de ratas. As dietas oferecidas continham farinha de soja aquecida, às quais foram adicionadas extratos salinos contendo ou não hemaglutinina, e extrato salino aquecido. Observaram que a dieta contendo hemaglutinina provocou uma diminuição do apetite, e um valor de PER (coeficiente de eficiência protéica) pior, embora não significativo, do que a isenta de hemaglutinina, sendo este parâmetro significativamente superior para dietas contendo extrato salino aquecido. Os autores concluíram que a hemaglutinina é um fator relativamente menor em sua contribuição para o baixo valor nutricional da soja crua, pois nenhuma melhoria no valor nutricional foi obtida quando as hemaglutininas foram removidas da soja.
Badui (1984), citado por LA BARCA et al. (1989), conclui que os valores de PER são diretamente proporcionais ao aquecimento da farinha de soja com vapor a 100ºC por tempos entre O e 15 minutos. GARLICH & NESHEIM (1966), alimentando aves com rações contendo hemaglutininas, observaram uma diminuição do crescimento, demonstrando seu efeito depressor quando consumida por via oral.
As hemaglutininas representam cerca de 3% do conteúdo protéico dos grãos de soja, e seus efeitos tóxicos podem ser eliminados com tratamentos adequados.
JAFFÉ (1972) e JAFFÉ & BRUCHER (1968) recomendaram que testes com eritrócitos bovinos tripsinizados fossem usados para a detecção dos feijões tóxicos e para monitoramento da adequação do tratamento térmico para a eliminação da toxidade da hemaglutinina de feijões.
A persistência de hemaglutinina na soja não aquecida suficientemente, quando ingerida não sobrevive intacta no trato digestivo devido a acidez intestinal e as enzimas digestivas (LA BARCA et al., 1989), sendo esta a razão, conforme estes pesquisadores, de que as hemaglutininas não afetam significativamente o valor nutritivo dos produtos derivados da soja.
Pelas observações dos trabalhos revisados fica evidente a importância da soja integral para a avicultura, porém, o uso efetivo do grão integral depende do seu processamento pelo calor, levando à necessidade de se conhecer adequadamente o binômio tempo-temperatura mais eficiente para o tratamento de cada material submetido a diferentes fontes de calor.

Esta revisão é parte integrante da
“Monografia apresentada ao “Centro de Pós Graduação das Faculdades Oswaldo Cruz” como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do curso de “Especialização em Gestão da Qualidade”
do Eng. Edilson Marques de Gouvêa
CONTROLE DE QUALIDADE DE MATÉRIA PRIMA
PARA FABRICAÇÃO DE NUTRIENTE ANIMAL

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